terça-feira, 28 de maio de 2013

Colunistas: LIVRE-SE DO GUILTY PLEASURE



Eu gosto muito mais de literatura fantástica atual do que dos clássicos literários em geral. Tenho vinte e seis livros do Stephen King e planejo alcançar toda a coleção antes que o velho escritor morra (e continue digitando do além, se bem conheço ele). Também tenho um livro do criador de CSI, Grau 26, e não tenho vergonha de dizer que é um dos thrillers de ação e suspense atuais que mais me chamou a atenção, tanto pela escrita quanto pela tentativa de fazer uma obra transmídia (ao final de cada capítulo você recebe um código para ativar no site do livro e receber um vídeo com cenas extras). Eu nunca li Paulo Coelho, mas vejo valor no que ele fez pela literatura brasileira no estrangeiro e tenho um livro dele na estante esperando sua vez de ser lido. Ah, e vale lembrar que eu também coleciono quadrinhos e adoro o traço e as histórias de Mark Miller, mesmo que todos digam que ele está ficando caduco.

Existem pessoas me julgando agora por conta de todos os autores que coloquei acima. Isso sempre acontece, com todo mundo. Quando você diz que gosta ou que não gosta de alguma coisa, uma pessoa ao teu redor (ou na tua rede social) irá te julgar a partir daquilo. Então classificamos o que é aceitável pela maioria (maioria intelectual, diga-se de passagem, porque realmente não ligamos pra opinião de gente “inferior” a nós) e o que não é aceitável. Para muitos amantes da literatura, Stephen King, Paulo Coelho, Zibia Gasparetto, Stephanie Meyer e tantos outros autores que não dedicaram suas vidas a produzirem uma obra clássica e revolucionária não são dignos de serem aceitáveis. E é por causa desse julgamento que mulheres leem Cinquenta Tons de Cinza e escondem esse fato a sete chaves, comprando o segundo e o terceiro volume e dizendo que é pra sogra. Rapazes de vinte e cinco anos que nunca leram Harry Potter carregam o primeiro volume, tentando vencer as chatíssimas trinta primeiras páginas (na minha opinião), e o colocam atrás do último Tolstói que adquiriram. Fãs de HQs, consumidores da Vertigo, dizem que estão comprando Turma da Mônica Jovem para seus afilhados, “aqueles bobinhos”, mas devoram a revista em apenas uma ida ao banheiro.

Se você se identificou com essas pobres pessoas que escondem seus gostos mais profundos de todos o que vou dizer agora será algo libertador, então escute com atenção:

Todo mundo tem seu prazer culposo.

Aquele cara que só fala de Tolstói, Nietzsche e Dostoiévski assiste The Voice Brasil no Domingo. Aquela senhora que fala tão mal de televisão, de Big Brother Brasil e Ídolos, lê romances leves de banca de jornal, como Sabrina e Roxanne. Até aquele vereador que assiste um filme como Ted e o condena por sua linguagem e possíveis apologias, assiste Futurama quando está sozinho em casa. Todo mundo tem seu “dirty little secret” cultural. Então por que não admitimos simplesmente que gostamos de coisas que nem todo mundo gosta e seguimos adiante com a vida?

A vergonha é uma das maiores armas da censura social. Desde sempre a sociedade usou da vergonha para manter homoafetivos, mulheres, gente pobre e pessoas que pensam diferente “no seu lugar”. Não tenha vergonha de seus gostos, de suas preferências, daquilo que faz de você o que você é (agora). Somos construídos por tudo aquilo que admiramos, que nos acrescenta ou nos transforma, mesmo nos mínimos detalhes e mais imperceptíveis pensamentos. Somos afetados das mais diferentes formas pelo que consumimos e isso é completamente pessoal. Não é porque você assiste BBB, lê Cinquenta Tons de Cinza ou Paulo Coelho ou gosta do traço do Liefeld que está fadado a entrar em uma definição de “pessoa menor”. Isso tudo são apenas influências, não é quem você é diante de si mesmo ou da sociedade.

Classificar é o primeiro passo para segregar.

Fuja dessa culpa, admita que gosta das coisas que gosta e ignore quem tenta te colocar em uma classificação “inferior” à da pessoa. Entenda que se você tem algo a mais do que a pessoa que está te julgando, esse algo é coragem. Porque aquela pessoa tem seu esqueleto no armário e você tirou o seu, vestiu-o e exibe-o junto a todos os outros esqueletos que te fazem ser quem é.



Lucas Rodrigues é, segundo sua própria definição, publicitário por formação, escritor por pretensão e leitor por dileção. Foi aluno da Oficina de Iniciação à Criação Literária, que acontece na Sapere Aude! Livros quinzenalmente aos sábados. Aceitando nosso convite, trará periodicamente suas reflexões sobre seu mundo de multireferências culturais.

Um comentário:

  1. Concordo em parte contigo, Lucas. Uma pessoa que tem Guilty Pleasures, de fato, não tem precisa ter vergonha de escondê-los. Agora, quando todos os prazeres de alguém são tão culpados que podem ser presos por formação de quadrilha, eis aí o limbo cultural.

    Oras, alguém que -só- lê Dan Brown, George R. R. Martin e similares não pode dizer que gosta de literatura. Alguém que lê esses caras -além- dos bons escritores, ok: guilty pleasure.

    Se alguém se derrete apenas com Crepúsculos e Tons de Cinza, essa pessoa tem toda culpa no cartório. Provavelmente adora BBB.

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