sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Você sabe?!?... A Sociedade Petalógica

por Mires Batista Bender



Na segunda metade do século XIX, o jornalista e tipógrafo Francisco de Paula Brito era dono de uma livraria no bairro do Catete, no Rio de Janeiro. Sua livraria, além de vender remédios, chás, fumo de rolo, porcas e parafusos, também era ponto de encontro de intelectuais. 

No ano de 1840, Paula Brito reuniu ali, pela primeira vez, a Sociedade Petalógica. A ideia era promover uma reunião para o estudo da mentira, da lorota, da peta, daí o nome “Petalógica”. Seus membros entendiam que através da profunda observação da mentira poderiam penetrar com mais acuidade a alma humana. Pensavam, também, em prejudicar os mentirosos, fornecendo material para que estes fossem se desmoralizando a cada vez que repetissem, julgando serem verdades, as mentiras ouvidas dos membros da Sociedade. Nota-se que havia um fundo de seriedade encoberto pela proposta jocosa dos encontros. 
De acordo com historiadores, Paula Brito juntou em torno da Petalógica, não só a intelectualidade da época, mas as mais diversas personagens, de distintas classes sociais. Como consequência, sua sociedade promoveu encontros entre a comunidade letrada e a não letrada. A Petalógica reunia representantes do movimento romântico dos anos 1840 aos 1860. Poetas, como Gonçalves dias e Laurindo Rabelo; romancistas, como Joaquim Manuel de Macedo, Manuel Antonio de Almeida e Teixeira de Souza; compositores, como Francisco Manuel da Silva e artistas como Manuel Araujo Porto Alegre e João Caetano dos Santos. 

Seu sócio mais ilustre foi, sem dúvida, Machado de Assis, que começou a frequentar aos dezesseis anos. Deve-se à Tipografia de Paula Brito a publicação da  primeira produção literária de Machado. Em 1855, foram publicados na Marmota Fluminense, Revista editada pelo livreiro, os seus poemas “Dona Patronilha”, “Ela” e “A palmeira”.  

O cronista Machado de Assis comentou, em 1864, que estava equivocado quem pensasse que a Sociedade era apenas movida pela pilhéria. De acordo com ele, cuidavam muitos que; por ser petalógica, a sociedade nada podia empreender que fosse sério; mas enganaram-se; a Petalógica tinha sempre dois semblantes; um jovial, para as práticas íntimas e familiares; outro sisudo, para os casos que demandassem gravidade. 

Em uma crônica escrita em 3 de janeiro de 1865 e publicada atualmente na página <http://www.cronicas.uerj.br>, Machado de Assis declara: “Este livro é uma recordação, – é a recordação da Petalógica dos primeiros tempos, a Petalógica de Paula Brito – o café Procópio de certa época, – onde ia toda a gente, os políticos, os poetas, os dramaturgos, os artistas, os viajantes, os simples amadores, amigos e curiosos, – onde se conversava de tudo – desde a retirada de um ministro até a pirueta da dançarina da moda; onde se discutia tudo, desde o dó de peito do Tamberlick até os discursos do marquês de Paraná, verdadeiro campo neutro onde o estreante das letras se encontrava com o conselheiro, onde o cantor italiano dialogava com o ex-ministro”. 



* Mires Batista Bender, doutora em Letras pela PUCRS, acredita que as palavras são magia e fez delas seu ofício. Professora de línguas e Literatura criou o primeiro fã-clube de escritor para homenagear a união entre seus maiores prazeres: pessoas e poesia. Interessada e curiosa por todos os temas que fazem fluir o poético, conversa sobre eles nesta coluna...

2 comentários:

  1. O estabelecimento com múltipla oferta de produtos de consumo, servia de atrativo para a apreciação dos livros, ensejando o convívio social e literário. Uma bela ideia a ser copiada nos dias atuais.

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