segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Lendo Fantasia: FAZER COM ARTE E NÃO PELA ARTE ou SOBRE O PEDANTISMO

Christian & Oriental Philosophy of Art
COOMARASWAMY, Ananda.
 Christian & Oriental
 Philosophy of Art.
(Foto: Goodreads)
Lendo recentemente O Herói de Mil Faces (The Hero With Thousand Faces) de Joseph Campbell e Filosofia da Arte Cristã e Oriental (Christian and Oriental Philosophy of Art) de Ananda K. Coomaraswamy, consegui formular para mim o porquê do pedantismo ser mais do algo errado: é também imoral, no sentido religioso do termo.

Tanto Campbell quanto Coomaraswamy entendem que existe um significado metafísico por trás da mitologia e da arte das sociedades tradicionais. Campbell também enxerga um conteúdo psicológico de transformação do ego em direção a um significado maior da existência. Já o escritor indiano insiste que toda a arte, ou seja, toda a técnica de fazer algo bem-feito implica uma busca do Bem, do Belo e do Justo. Assim, todas as pessoas, do carpinteiro ao matemático, deveriam fazer o que fazem com arte. Porém, a arte é apenas o meio e não o fim do que fazem. O fim é a busca da Verdade.

Pedantismo é quando se dá mais importância ao meio que à finalidade em si.

Todas as vezes que fui pedante senti-me profundamente envergonhada depois. Parece ser, infelizmente, uma tendência nas pessoas que acumulam muito conhecimento sem digeri-lo direito. O pendantismo é errado porque ter mais informação acumulada não dá a ninguém o direito de menosprezar os outros. Analisando por esse prisma, ser pedante equivale a ser mal-educado. Você fala uma língua que ninguém entende só para se exibir. 

O Herói de Mil Faces
CAMPBELL, Joseph.
O Herói de Mil Faces.
O desprestígio atual dos intelectuais está muito ligado a isso. Muitos acadêmicos e intelectuais, principalmente da área de Humanas, não estão transformando o seu saber. Ao invés de ajudar as outras pessoas a chegar à Verdade ou dar uma luz sobre um problema real, perdem-se em exibições e competições de ego. Como querer que alguém simpatize com isso?

Na literatura de Fantasia, o pedantismo consiste em se alongar indevidamente sobre o mundo que se criou, exibindo-o em detalhes exagerados, atrapalhando a narrativa. J.R.R. Tolkien criou um universo paralelo, porém usou apenas o que interessava à sua narrativa. O resto foi publicado em apêndices ou como livros independentes. O professor de Oxford conhecia várias línguas antigas, mas não entupiu O Senhor dos Anéis com citações em anglo-saxão ou gaélico. Mervyn Peake, da série Gormenghast, escreve em um estilo propositadamente empolado, parecido com o dos escritores do século XIX (como Dickens) porque quer dar a ideia de um lugar antiquado e sufocado pela tradição. Nenhum deles queria se exibir ou intimidar o leitor. O que os movia era o amor à língua inglesa, no caso de Peake, e o amor à mitologia, no caso de Tolkien. Dois exemplos a serem seguidos.


 *Patrícia Degani é mestre em Filosofia Antiga e Medieval pela PUCRS. Leitora e pesquisadora da literatura de Fantasia, escreve regularmente no blog Lendo Fantasia. É uma das coordenadoras da Breviário Cursos, pela qual ministrará, no dia 25 de outubro próximo, o curso ESCREVENDO FANTASIA, que está com as inscrições abertas.

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